Em programação especial, NERA e NUGE debatem imagem pessoal e profissional das mulheres
Em celebração ao 8M – de Luta das Mulheres, núcleos de estudos realizaram série de eventos em março que debateram imagem feminina no cotidiano e na internet
Reportagem: Ana Luiza Sidronio [1]
Edição: Raphael Odilon [2]
Supervisão: Prof. Gean Gonçalves [3] e Prof. Wiliam Pianco [4]
O 8 de março, Dia Internacional da Mulheres, foi o primeiro dia da programação especial do NERA (Núcleo de Estudos Étnico-Raciais) e do NUGE (Núcleo Estudos de Gênero e Sexualidade) dedicada à luta das mulheres.
A arte-educadora Carla Domiciano foi a primeira convidada. Ela é graduada em Artes Visuais e Educação pela FMU, pós-graduada em Artes e Educação, afroempreendedora e CEO da Neguethes. Domiciano criou a marca Look da Preta, além disso é integrante da rede de consultoras negras de imagem e estilo. A mediação da primeira conversa foi feita pela professora Virginia Bertolomeu, dos cursos de Design, Moda e Artes.
Mais tarde, a professora Maria Lucia da Silva recebeu Renata Thomaz, que é jornalista com mestrado e doutorado em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ. É professora adjunta na Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getúlio Vargas/RJ. Realiza pesquisa pós-doc no (PPGMC/UFF), investigando as relações entre mídia, processos de socialização de crianças e cultura digital.
Ambas as atividades foram organizadas a fim de refletir sobre a igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas (cis e trans). O debate contou com a participação de alunas, funcionárias e professoras da FMU-FIAM FAAM. Assim, cada uma pode refletir sobre as violências estéticas impostas pelas mídias de massa, na cultura digital e nas redes sociais, na família e nos espaços profissionais, mas também reconectar a autoestima e conhecer estratégias de apresentação de si.
No dia 14, o segundo encontro foi mediado pelas professoras Maria Lúcia, do curso de Jornalismo, e Eloísa Santos, do curso de Serviço Social, que conduziram um papo instrutivo com a convidada Suelen Marcolino, gerente de diversidade, inclusão e pertencimento para América Latina, África, Europa e Oriente Médio no LinkedIn. Ela tratou da diversidade e da representatividade negra e feminina no mercado corporativo. O foco da fala da convidada foi a experiência pessoal em carreira e trabalho quando a mulher está fora do “padrão corporativo”.
Suelen participa ativamente de eventos e palestras sobre tecnologia, networking, e diversidade e inclusão na rede LinkedIn. É formada em Relações Internacionais e Marketing Digital pela FGV e esteve presente no ranking da Forbes que destaca os 10 profissionais negros que estão fazendo história nas grandes empresas de tecnologia. Ela também aparece no ranking da FGV como uma das 25 pessoas mais importantes da tecnologia no Brasil em 2022.
A convidada apresentou diversas dicas e ideias para quem deseja construir um perfil que se destaque na rede LinkedIn, e destacou: “nosso objetivo é criar oportunidades econômicas para todos os membros da força de trabalho, desejamos conectar os profissionais do mundo para torná-los mais produtivos e bem sucedidos. Com a construção histórica e social que nos é imposta pelos padrões da sociedade, nossas chances muitas vezes podem acabar diminuindo quando disputamos uma certa vaga com outros tipos de pessoas que não sofrem o mesmo”.
Para ela, o LinkedIn ajuda as pessoas a se comunicarem de forma abrangente e chamarem atenção de maneira positiva, apesar de a rede não ser o único jeito de fazer isso. Suelen trouxe exemplos de elementos atrativos para a construção de um perfil assertivo na rede. “Não basta informar, é preciso informar com qualidade”.
O LinkedIn é a maior rede digital quando se fala em empregabilidade, possui mais de 900 milhões de usuários pelo mundo todo e conta com 2 novos usuários a cada segundo. Com a participação ativa na rede, é possível criar conexões enriquecedoras com outros usuários e com diversos tipos de pessoas das quais jamais se imaginaria interagir nos mesmos ambientes e no ambiente corporativo.
No dia 22, os núcleos promoveram um encontro virtual com Sheila Basílio, que contou com a mediação de Daiane Borges da Silva. Ambas são formadas em Artes Visuais e sendo que Sheila é egressa da FMU. Sheila também é graduada em pedagogia e pós-graduada em Educação e Literatura para jovens e crianças (Instituto Vera Cruz), atuando como professora de Artes para o ensino infantil e fundamental.
A nossa identidade é quem nós somos e ela impacta diariamente nas nossas relações íntimas e pessoais, em todos os ambientes que frequentamos. A construção dessa identidade pessoal enquanto alguém que não é visto como adequado aos padrões impostos pela sociedade pode ser resiliente quando há meios de se reeducar e se desconstruir.
Em sua fala, Sheila tratou da violência estética imposta, principalmente, às mulheres, com uma especificidade maior para as mulheres negras, já que as representações de beleza há anos causam desgaste emocional e psicológico para elas. A maioria das representações femininas na mídia são de mulheres com o perfil caucosiano, isto é, europeu, branco, magro, de cabelos e olhos claros.
O diálogo entre as professoras trouxe questões sobre autoconhecimento e empoderamento racial aos presentes, e como combater o racismo e a falta de autoestima. Desde a infância, Sheila diz ter sido muito afetada por esses padrões de beleza e passou por períodos depressivos. Ela terminou o ensino médio em 1998, mas adiou o ingresso na faculdade por essa questão, o que ocorreu em 2016, quando decidiu que gostaria de desenhar e escrever histórias.
“O impacto emocional que tudo isso causou em mim me fez me fechar no meu próprio mundo por muito tempo. Quando entrei na faculdade, foi com o objetivo de criar livros infantis e passar mensagens através deles. A arte é como um refúgio para mim. Desde criança não me sentia uma pessoa bonita e em todos os lugares eu sempre via meninas magras e brancas. Por ser uma mulher gorda, eu me sentia nervosa, com vergonha do meu corpo, e levei muito tempo para entender o meu corpo como parte de mim”.
Sheila também falou abertamente sobre o acolhimento e luta contra transtornos de depressão e ansiedade, que afetam hoje mais de 10 milhões de brasileiros, segundo a OMS – Organização Mundial da Saúde. Ela falou ainda sobre como a arte a ajudou a se reencontrar e se conectar consigo mesma, e de como a arte também pode ser uma ponte para as pessoas se encontrarem e conhecerem melhor a si mesmas.
“Nós que sofremos com o racismo carregamos uma bagagem muito ruim nas nossas vidas. Quando mais nova eu não entendia sobre toda essa questão racial, não havia ninguém me aconselhando sobre isso, mas hoje fico feliz de estar ali para essas crianças e ser para elas alguém que pode ajudar”.
O livro cuja autoria é de Sheila, “A Menina que Mora em Mim”, foi publicado pela editora Jandaíra em 2022, justamente por trazer um foco especial sobre histórias de pessoas pretas e indígenas em uma proposta de empoderamento racial para crianças, jovens e adultos.
Sobre o processo de criação, Sheila diz que quando estava na terapia, teve que fazer um exercício que consistia em acessar a sua criança interior, expor seus traumas e entender tudo que tinha acontecido. “No começo eu não queria fazer, mas acabei escrevendo uma história ao longo do caminho e depois percebi que essa história também era sobre eu mesma. O nome da personagem retratada no livro é Maria, em homenagem a minha mãe. Quando eu escrevi o livro, eu não tinha noção do quanto ele era importante. Para mim, era algo inalcançável e não achei que fosse acontecer tão rápido”.
“Quando escrevi o final, eu não queria o tradicional felizes para sempre. Essa luta contra os padrões continua, permanece pela vida inteira”. Na concepção visual do livro, a autora mencionou que a inspiração vem dos elementos da costura. “Acho que a costura reflete a nossa vida de certa forma, com as linhas, nós e divisões que criamos entre nós”.
Sheila está no processo de produção de seu segundo livro, o qual irá abordar problemas de ansiedade através de uma nova personagem. “Quando você olha pra trás e entende todas as coisas dolorosas que aconteceram com você, precisa ser forte para encarar tudo e se reerguer. Fico feliz de hoje ver mulheres gordas felizes com seus corpos, mulheres negras felizes com seus cabelos e características”.
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No último dia de programação, no 29 de março, foi a vez da jornalista Mayara Lobato que conversou com os professores Maria Lucia e Manuel Fabricio de Andrade, respectivamente, coordenadores do NERA e do NUGE. Por sua vez, Lobato é mestra em Comunicação na Contemporaneidade pela Cásper Líbero e doutora em Comunicação e Práticas de Consumo pela ESPM-SP. Ela atua como professora em cursos de graduação e pós-graduação nas áreas de Moda, Comunicação e Negócios, é formada em Consultoria de Imagem e Estilo pela Belas Artes e fundadora do ML Fashion Lab, onde é estrategista de imagem e estilo e pesquisadora de tendências.
“Moda, imagem, consumo e comunicação estão mais interligados do que parecem. Dentro da nossa sociedade, a imagem é algo muito importante, pois além de passar aos outros uma impressão inicial de quem nós somos, também é capaz de transmitir mensagens”. Na teoria, não precisamos provar nada com a nossa imagem, mas Mayara Lobato mostra como esse senso comum é uma ideia distorcida.
“Nossa competência é inicialmente avaliada pela imagem. Em uma sociedade capitalista, o que você aparenta ser ou ter importa mais do que realmente se é ou tem”, explica Mayara. “Principalmente para nós mulheres, que fomos colocadas numa posição onde temos que performar beleza, delicadeza, cuidados estéticos e etc. Essa cobrança em relação a imagem é muito maior para nós, e hoje, a imagem é como um patrimônio”.
Em relação aos padrões estéticos, Mayara falou sobre como as exigências com as mulheres e homens são diferentes. “Somos muito mais cobradas pela imagem do que os homens. Quando há um homem e uma mulher com a mesma roupa, algo simples, podemos perceber que a vestimenta do homem vai ser vista como símbolo de sua personalidade, mas a mulher, provavelmente, vai ser tratada como alguém desarrumada. E uma mulher malvestida é vista como incapaz e desleixada”.
Segundo Mayara Lobato, a visão do outro sobre nós impacta na nossa experiência em todos os ambientes. Para ela, o mercado de moda mudou muito, mas as vezes fica superficial e as pessoas querem ditar e julgar o que é realmente elegante e/ou sofisticado. “A verdade é que você deve se vestir de si mesmo. A moda e o estilo são sobre passar uma mensagem sobre quem você é”.
Com o digital, para a convidada, vemos cada vez mais presentes os filtros nas fotografias aplicados para modificar ou padronizar rostos e corpos. Sobre isso, Mayara enfatiza que as redes sociais que um dia foram um lugar de conexão com outras pessoas, hoje são um lugar de muita insegurança. “A geração Z é a que menos faz uso das redes sociais hoje em dia, por incrível que pareça”.
Mayara Lobato dá dicas de colorimetria, área que estuda como cada cor e forma pode transformar a imagem e a mensagem que uma roupa pode transmitir, mas aconselha os estudantes da FMU | FIAM-FAAM a serem eles mesmos, acima de tudo.
[1] Aluna do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, estagiária AICOM – Repórter
[2] Aluno do curso de Jornalismo FMU/FIAM-FAAM, estagiário AICOM – Editor
[3] Professor do curso de Jornalismo, supervisor de estágios AICOM
[4] Professor do curso de Jornalismo, supervisor de estágios AICOM